sexta-feira, maio 19, 2006

Geografia Vitoriana

Eram 4 da tarde de um Domin- go de 1965. Uns poucos tinham ido de carro e a maior parte na excur- são, mas estavam quase todos para Tomar. E quando o Vitória jogava fora, o bairro ficava entregue aos velhos e a algumas mulheres. Há que dizer que, depois dos jogos com o Tramagal e com o Torres Novas, já não havia hipótese de subir à Segunda do Nacional. Mas, mesmo assim, acompanhava-se o Clube. Aproveitava-se e conhecia-se a terra.

Treze anos depois, o entusiasmo estava ao rubro. A equipa subira à Terceira na época anterior, e, fosse qual fosse o campo, de Bucelas a Campo Maior, de Borba a Benavente, não faltava o grito: “Vamos embora, Vitória”. Fica para a história das desilusões que, nas últimas jornadas, o Elvas passou à frente e adiou o sonho da Segunda Divisão para outros anos. Mas, que remédio, ao menos ia-se passeando, comendo e rindo.

Na época seguinte, com 9 anos, já eu respondia de ponta de língua quando me perguntavam se era Benfica ou Sporting: “Sou do Vitória”. Lembro-me de ter visto um ou dois jogos, mas não sei com quem. Aliás, só muito mais tarde é que soube que tínhamos ficado outra vez em terceiro no campeonato. E que o Oriental e o Estrela da Amadora é que tinham subido à Segunda.

Aí, pese toda a esperança de um bairro de fibra (“Para o ano é que é”) e sem que ninguém o adivinhasse na altura, começou o lento declínio. Das camisolas vermelhas mais aguerridas de toda a Lisboa e da geração que tinha ido a Tomar em 65. E nunca mais o Vitória esteve perto de subir à Segunda.

Os campos passaram a ser mais pequenos, os balneários mais acanhados e no Distrital deixaram de fazer sentido as excursões. Mas foi então que, deserdado dos tempos áureos, comecei a seguir o VCL. E a alinhavar toda uma geografia que se materializava em campos de futebol. Domingo sim, domingo não, primeiro à boleia e mais tarde no meu Corolla de 72, também eu me juntei ao grito.

Na Charneca (que parecia uma praça de touros), no Operário (quase um derby), em Camarate (ao lado de um cemitério), nos Olivais (outro cemitério), na Musgueira (onde levei umas estaladas), no Damaiense (onde éramos sempre roubados), no Palmense (onde sempre perdi), no Porto Salvo (um metro da linha lateral à linha de grande área), no Domingos Sávio (onde as duas linhas quase coincidiam), em Agualva (os melhores couratos), em Santa Iria (porrada e invasão de campo), no Unidos do Bairro Padre Cruz (invasão de campo e porrada, acho), etcetera, etcetera… Enfim, poderia tranquilamente e de memória juntar-lhes mais vinte pelados. Ou trinta.

Hoje, os meus Domingos têm outros rumos. Fico menos vezes rouco e já não entro em casa de botas enlameadas. E, a esbracejar na I Divisão B do Distrital de Lisboa, o Vitória até está numa espécie de Segunda dos Mais Pequenos.

Mas, e porque há afectos que nos acompanham até ao fim, sou orgulhosa e incondicionalmente do Vitória. Há quem lhe chame, porque sempre assim lhe chamaram, Vitória da Picheleira.

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4 Comments:

Blogger Pitx said...

Isto não ficava bem se ficasse só por um comment.

http://pipaterra.blogspot.com/2006/05/vamos-embora-vitria.html

Entendidos?

20 maio, 2006 00:13  
Anonymous Anónimo said...

Escreve quem sabe! Mais um bom momento.Abraço.

20 maio, 2006 11:58  
Anonymous Anónimo said...

Parabéns pelo inteligente modo de dares um cantinho do teu blogo de viagens ao Vitória, esse quase sexagenário clube da Picheleira.
Obrigado por me espevitares a memória. Abraço.

21 maio, 2006 01:27  
Blogger José Costa Alves said...

Ó Quelho, bem me viraste do avesso agora. E, sim, mais que entendido. «» Jorginho, começo-me a habituar aos teus carinhos e é o caraças... «» Sócio, há viagens e viagens. E eu é que agradeço ires passando por aqui.

Aos Três, o Abraço

21 maio, 2006 13:16  

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