Na retrete (Ouarzazate, 2003.03.04)

Sei que fizeram tombar sobre o homem as mais terríveis maldições, mas é chegada a hora de o dizer: a 3 contos o quarto, as torneiras não têm banho de ouro. E até são admissíveis as toalhas rasgadas e o papel higiénico que não aparece. Nesses momentos, tem é que se pensar que há pior. E passo a transcrever com uma pronunciada vénia pela aromática lição de vida:
"Uma das casas de banho estava espectacularmente entupida: a única que restava era utilizável, mas não convidativa. Como quase todas as casas de banho egípcias, a retrete estava equipada com um pequeno cano (não muito diferente do bocal de um fagote) que esguichava água para cima para abluções íntimas. O cano tinha uma orla de excrementos de uma pessoa qualquer. (…) Em criança, a minha primeira visão de uma casa de banho de buraco no chão foi em França (…); mais tarde, a minha aculturação iemenita ficou completa quando renunciei ao papel higiénico.
E [tenho] algumas recordações menos felizes: aquela vez em que os meus óculos, lubrificados pelo suor, me escorregaram do nariz para um buraco malcheiroso perto do Mar Vermelho, e o horror, o horror de um cagatório público nos arredores de Simferopol."
Porque, na realidade, quando é chegada a hora, há é que senti-la com prazer. E sigo em respeitosa homenagem:
"Tenho muitas recordações agradáveis de defecar em lugares distantes: num alpendre sem porta com vista para o Estreito de Harris, cravejado de ilhas; no baluarte de um castelo iemenita situado sobre um penhasco alcantilado, com o vento a soprar por ele acima; fustigado pela espuma das ondas na popa de um sambuq ao largo das ilhas de Kuria Muria; dentro do guarda-fatos de uma mansão otomana em Safran Bolu."
Fecho com um puxão de autoclismo: quem não quiser, que se encolha.
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